O choque de correntes pelo chão ecoa na madrugada.
Das janelas,a luz funérea lunar penetra friamente pelas janelas.
Toda aquela história de amor é cinza e pó pelas mesas.
Mas quem apura os ouvidos consegue escutar, além das correntes, a música do baile.
Era o baile do casamento.
O noivo olhava para seu relógio de bolso, herança do avô, a hora da surpresa para a noiva.
Pediu ao seu melhor amigo que a levasse para o jardim. Ali faria a surpresa. Daria o presente que ela tanto desejava: uma corrente de ouro com diamantes que brilhavam como a lua cheia.
Guardando o relógio no bolso, com a corrente dele pendurada fora, ele segurou a caixinha e foi para o jardim.
Distinguiu ao longe o amigo com a noiva. Sorriu pela cumplicidade do amigo.
Sabia que logo ele a deixaria ali sozinha, para que então ele entrasse no clarão lunar e entregasse seu presente.
Mas ao invés disso, presenciou algo que torturou seus olhos: a noiva, mesmo com a recusa do amigo, o abraçou e beijou.
O gelo do ódio picava seu corpo inteiro. Viu o amigo horrorizado ainda dar uns passos para trás, antes de virar o rosto em sua direção.
Então a noiva também se virou - como
em c â m e r a l e n t a e o viu.
O choque das correntes ainda ecoa em seus ouvidos. Foi a primeira coisa que viu por perto. As correntes que fechavam o portão antigo de ferro.
Um pouco do vermelho respingado em seu terno, na corrente do relógio de bolso que era do avô, na corrente de ouro com diamantes que estava ao lado da cabeça aberta da noiva.
Fechou-se o local do jeito que estava. Nunca mais teve baile, Nunca mais teve música. Nunca mais teve cor.
(Texto: Susan Blum. Foto: Zé Suassuna.)
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