Eu
estava para entrar no meu edifício quando a vi. Minto. Na verdade eu já a
observava quando virei a esquina, pois seu corpinho encurvado, seus passos
trôpegos e seu olhar assustado, já me indicavam uma boa personagem.
Quando
eu estava para abrir meu portão, ela estava bem próxima e me perguntou com seus
olhinhos azul mar calmo e uma voz límpida: “Eu moro aqui?”.
Aquela
pergunta me perturbou profundamente. Respondi calmamente: “Não sei, mas vamos
perguntar ao meu porteiro”.
Recebi
uma negativa junto com uma colocação que me deixou ainda mais perturbada: “ela
está andando a manhã toda por aqui por perto. Vai, volta, fica olhando os
prédios e balbuciando algo. Acho que está perdida.” Novamente a olhei. Percebi
que por baixo do grosso e longo casaco preto ela estava de pijamas e pantufas.
E
ninguém a procurou até agora? Pergunto eu, recebendo nova negativa. Bom, era
meu horário de almoço. Então resolvi que iria com ela de prédio em prédio até
achar onde morava. Iniciei pela minha rua mesmo, que tinha uns seis prédios só
na minha quadra. Depois fui dando a volta no quarteirão, fazendo um redemoinho
com a senhorinha a tiracolo, o que prolongava mais o tempo, pois os passos
incertos me preocupavam. Suas mãos trêmulas, com dedos magros e quase azulados,
volta e meia passavam por seus cabelos branquíssimos desalinhados.
Na terceira
volta do redemoinho, a três quadras de minha casa, o porteiro de um prédio me
chamou ao me ver quase entrando no prédio da frente. “Dona Endaira, aqui!” Vi
que a senhora parou. Parei também. O porteiro veio e me disse que a senhorinha
morava ali, no Edifício Creta. Que eu podia deixar com ele.
Ao ver o olhar assustado da senhorinha resolvi que deveria entregar eu mesma à família e insisti neste ponto com ele. Após um tempo ele interfonou para o apartamento do sétimo andar, dizendo que a Dona Endaira estava acompanhada.
Ao ver o olhar assustado da senhorinha resolvi que deveria entregar eu mesma à família e insisti neste ponto com ele. Após um tempo ele interfonou para o apartamento do sétimo andar, dizendo que a Dona Endaira estava acompanhada.
Permitiram
a minha subida. Ao entrar no elevador percebi que a senhorinha tremia muito.
Fiquei imaginando que as ondulações que percorriam seu corpo era por estar
reconhecendo o ambiente.
Toquei
a campainha e um rosto juvenil escancarou a porta, sorrindo pra mim e para a
senhorinha. “Vovó querida! Que susto que me deu!” E me explicou que a vó havia
saído enquanto ela dormia de manhã cedo. Feliz por ter cumprido meu dever, por
ter dado àquela senhorinha um presente (seu retorno ao lar), sorri e me despedi
dela, que me deu um abraço tão forte que jamais imaginaria para um
corpo tão frágil.
Fecharam
a porta e apertei o botão do elevador ao mesmo tempo que escutei um barulho
surdo vindo de dentro do apartamento, seguido de uma voz ríspida: “Que merda
vovó. Já falei pra você não sair daqui!”
(Texto: Susan Blum. Imagem: retirado de http://studio58cartoons.blogspot.com.br/2012/09/velhinha.html)
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